Através da plataforma Sesc Digital, a Bienal apresenta uma mostra de obras e espetáculos que rememoram o coreógrafo e bailarino morto em abril de 2021, aos 66 anos, vítima da Covid-19. Registros audiovisuais de espetáculos concebidos e interpretados por Ismael Ivo, bem como o recém-lançado documentário sobre a vida e a obra do artista integram a coleção.
Negro e filho de empregada doméstica, Ismael Ivo, contrariando os indicadores sociais, saiu da periferia da cidade de São Paulo para tornar-se uma figura consagrada e reconhecida no Brasil e no mundo. Os brasileiros Ruth Rachou, Renée Gumiel, Klauss Vianna, Dulce Aquino e Marcia Haydée, e o estadunidense Alvin Ailey são alguns dos nomes com quem Ismael compartilhou vivências pedagógicas e profissionais. Criou e dirigiu o Festival ImpulzTanz, em Viena, foi diretor do Teatro Nacional Alemão, em Weimar, diretor da Bienal de Veneza e idealizador do L’Arsenalle della Danza.
A Coleção Ismael Ivo abre com a apresentação de um recorte especial do acervo da série Dança Contemporânea, produzida e exibida pelo SescTV desde 2007. Dentre os espetáculos programados estão: Mapplethorpe (2007), tributo ao fotógrafo estadunidense Robert Mapplethorpe; Babilônia: Il Terzo Paradiso (2012), com bailarinos de 25 nacionalidades; Erêndira (2014), que compõe o projeto Biblioteca do Corpo; e Logos Diálogos – Parte 3 (2014), com direção e interpretação musical do violoncelista Dimos Goudaroulis e coreografia e interpretação de Ismael Ivo. Todos os trabalhos foram dirigidos por Antonio Carlos Rebesco e apresentam, além das versões editadas dos espetáculos, entrevistas exclusivas com os artistas.
O Acervo do SescTV traz ainda a videoarte Me Empresta Teus Olhos – Ismael Ivo (2014), dirigida por por André Guerreiro Lopes.
A novidade da mostra fica por conta do recém lançado Ismael Vivo. Produzido em 2021 pela TV Cultura e dirigido por Alberto Pereira Jr., o documentário reúne mais de 30 depoimentos e uma coleção de registros de várias fases da carreira do artista, dentre eles, imagens raras do acervo da própria emissora. A narrativa é conduzida pelo olhar da jovem atriz e cantora fluminense Merícia Cassiano.
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Ismael Vivo (2021)
Direção: Alberto Pereira Jr.
O documentário Ismael Vivo revela quem era o humano atrás do artista, seu lado político, e como o poder transformador da arte pode inspirar pessoas. “Ismael Ivo é um ícone da dança mundial. Devido ao seu talento e trabalho incansável, se consagrou nos principais palcos internacionais. Negro e periférico, extrapolou as estatísticas sociais, mostrando o poder transformador da arte. Criou e apoiou inúmeras iniciativas de inclusão social a partir da arte. A história de Ismael serve de inspiração para muitos jovens, ela valida que é possível acreditar nos sonhos”, diz o diretor Alberto Pereira Jr.
Mapplethorpe (2007, 57 min, 14 anos)
Direção para TV: Antonio Carlos Rebesco
Então radicado na Alemanha, Ismael Ivo apresenta o espetáculo solo criado em tributo ao polêmico fotógrafo norte-americano Robert Mapplethorpe (1946-1989), que retrata, de forma erótica, corpos de homens negros se opondo à moralidade e intolerância racial da sociedade estadunidense da época. Dividida em três partes, Prisão, Flores e Mortalidade, a coreografia evidencia tabus através da fotografia e da dança.
Babilonia: Il Terzo Paradiso (2011, 52 min, 12 anos)
Direção para TV: Antonio Carlos Rebesco
O espetáculo envolve 25 bailarinos de diferentes nacionalidades do L’Arsenale della Danza, da Bienal de Veneza, e é o último trabalho de uma trilogia artística que traz à cena questões ambientais e a nossa própria capacidade de sobrevivência. “Essa é a ideia de Babilonia: Il Terzo Paradiso: pessoas de culturas e corpos diferentes que tentam encontrar uma nova forma de se expressar. Babilonia é um pouco esse quadro aberto de fantasia, de tentativa da dança como espelho da sociedade – como um documento de um indivíduo hoje na sociedade, que faz da arte o seu veículo de expressão”, explica o coreógrafo.
Biblioteca del Corpo (2012, 58 min, 16 anos)
Direção para TV: Antonio Carlos Rebesco
A coreografia inspirada no conto A Biblioteca de Babel, do argentino Jorge Luis Borges, apresenta a concepção dos corpos como livros que contêm diferentes informações e fazem parte de uma espécie de “enciclopédia humana”, com diversas informações e identidades neles presentes. Ismael Ivo concebeu a obra e dirigiu bailarinos do L’Arsenale della Danza, da Bienal de Veneza, espécie de mestrado em dança para artistas jovens, proporcionando um aprofundado conhecimento corporal e amadurecimento de seus bailarinos. A cenografia de Marcel Kaskeline proporciona uma instalação que reporta ao ambiente de uma enorme biblioteca, na qual os corpos encaixotados em pequenos compartimentos acabam por romper as repartições e iniciam a jornada por troca de informações.
Erêndira (2014, 55 min, 16 anos)
Direção para TV: Antonio Carlos Rebesco
Coreografia embrionária do projeto Biblioteca do Corpo, dirigida por Ismael Ivo e inspirada no romance A Incrível e Triste História da Cândida Erêndira e da Sua Avó Desalmada, do colombiano Gabriel García Márquez. Estreado em Viena, no ImPulsTanz Festival, o espetáculo traz à baila questões relacionadas à prostituição infantil, presente na obra literária, em que a avó da menina Cândida Erêndira resolve prostituí-la em troca de dinheiro e de alimentos, destruindo o sonho de a criança tornar-se bailarina. Também dialoga com o realismo mágico presente na obra do autor e nesse imaginário que povoa toda a América do Sul. Com a atriz convidada Cleide Queiroz e dançarinos convidados Stefano Roveda e Valentina Schisa.
Logos Diálogos – Parte 3 – Ismael Ivo e Cia Anacã (2014, 56 min – o programa é composto por dois espetáculos, Livre)
Direção para TV: Antonio Carlos Rebesco
Ambos espetáculos dialogam com as Suítes V e VI de Johann Sebastian Bach, executadas pelo violoncelista Dimos Goudaroulis e coreografados por Ismael Ivo e Deborah Colker. No palco, o violoncelista é acompanhado por Ismael Ivo e Cia Anacã. A palavra “diálogo” foi somada ao título para significar vários tipos de interações: o diálogo entre a música e a dança, entre um instrumentista dedicado à obra de Bach e coreógrafos criadores conceituados, entre o antigo e o contemporâneo nas linguagens artísticas, entre o som e o movimento, a música, a dança, o cenário e a iluminação. Idealizado por Luiz Felipe D’Àvila e Ana Diniz, a concepção e direção artística dos trabalhos são de Goudaroulis, que ao longo de 25 anos estudou as seis suítes de Bach.
Me Empresta Teus Olhos – Ismael Ivo (2014, 1’44”)
Direção: André Guerreiro Lopes
Videoarte gravada com Ismael Ivo durante edição do Mirada – Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas de Santos, em 2014, na ação Laboratório Audiovisual realizada pelo SescTV no contexto do projeto Imersão Olho-Urubu: Olhos de Espelho.
A Sagração da Primavera (2018)
Em A Sagração da Primavera, a beleza se introduz com uma suave chuva de pétalas de rosas. Porém, subsequentemente, dá lugar a uma tempestade de pétalas, num delírio incessante e incontrolável. Uma metáfora e uma forma de alarme do desequilíbrio das condições ambientais. A coreografia se encaminha para um ritual coletivo em que cada membro se torna um veículo que expressa conflitos contemporâneos, desejos, aspirações, sensualidade e gênero. O corpo tentando despertar seus instintos primários. Um ritual misterioso, que busca a beleza, desejos, sensualidade e aspirações humanas.